Por trás das missões que envolvem centenas de trabalhadores em Campos dos Goytacazes, uma exigência do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro expõe a fragilidade de anos de contratações irregulares. O município corre contra o tempo para se adequar – e evitar um colapso nos serviços essenciais.
Fim de uma era: mais de 10 mil RPAs estão sendo desligados. E agora?
As missões dos trabalhadores contratados por Recibo de Pagamento Autônomo (RPA) em Campos dos Goytacazes não são uma surpresa repentina – mas o impacto é devastador. Por trás das dispensas está o Termo de Ajustamento de Gestão (TAG), firmado com o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), que exige a extensão completa desses vínculos até abril de 2026. A justificativa? Regularizar a força de trabalho e acabar com contratações consideradas precárias, comuns há anos no funcionalismo municipal.
O que está em jogo?
Os campos tinham, em 2023, cerca de 8 mil RPAs ativos , especialmente nas áreas de Saúde, Educação e na Fundação Municipal de Saúde. Com a nova reestruturação aprovada pela Câmara Municipal, a administração planeja criar novas secretarias, cargos e realizar concursos públicos – mas a conta não fecha.
O novo organograma prevê 1.500 cargas DAS , o que cobre apenas 14% das contratadas via RPA . Isso deixa cerca de 9.300 trabalhadores sem perspectiva clara de realocação .
Pressão do TCE-RJ, déficit milionário e falta de um plano sólido
O município decidiu uma verdadeira solução de difícil solução: precisa cortar vínculos informais, mas não tem orçamento para reportar os quadros na mesma escala. O déficit projetado é de R$ 28 milhões em 2024 , e ainda houve perda de R$ 31 milhões anuais com o fim de repasses de custos judiciais. Tudo isso restringe a capacidade de contratação por meio de licitações ou terceirizações.
Enquanto isso, a TAG impõe um cronograma implacável: 150 dias para apresentar o plano de transição , e 24 meses para concluir toda a reestruturação .
Trabalhadores apreensivos, protestos crescentes e o risco de apagão nos serviços
A ocorrência dos RPAs é de angústia e indignação. Muitos atuam há anos em setores-chave da cidade e agora se veem à margem de qualquer garantia. Já há mobilizações envolvendo a OAB, sindicatos e servidores da saúde, que bloqueiam mais transparência e alternativas reais de demissão em massa.
Quais seriam as saídas?
Apesar das obrigações impostas pela TAG, algumas estratégias poderiam reduzir o impacto social:
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Concursos emergenciais , principalmente na Saúde (previstos para 2025);
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Terceirização com prioridade a ex-RPAs em editais;
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Ampliação do número de cargas DAS , embora isso tenha implicações fiscais;
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Programas de requalificação profissional , para recolocação no mercado.
Porém, nenhuma dessas medidas tem implantação imediata, e os obstáculos são numerosos: estudos de impacto não concluídos , restrições orçamentárias e ausência de um plano robusto de realocação .
Conclusão: cumprimento da lei, mas a que custo social?
As demissões dos RPAs não são arbitrárias – são exigência legal. No entanto, a forma como estão sendo prolongadas, sem garantias reais de análise da mão de obra, levanta uma questão central: está se priorizando o cumprimento formal do TAG em detrimento da proteção social e da continuidade dos serviços públicos?
Com milhares de profissionais fora do sistema e um cronograma rígido em curso, Campos dos Goytacazes vive um momento decisivo. O futuro da gestão pública – e de milhares de famílias – depende agora da capacidade política, técnica e financeira da Prefeitura de transformar uma imposição legal em uma transição justa.